A súbita generosidade que
repentinamente acometeu alguns ricaços por esse mundo fora, deixa-me de pé
atrás. De desconfiança e, simultaneamente, de vontade de o – ao pé – balancear
em direcção às partes budibundas dos que se andam a oferecer para pagar um
qualquer imposto que contribua para amenizar a crise e daqueles que ficaram em
êxtase com a ideia. Isto porque, tal como não há almoços grátis, também não há
“ofertas” destas completamente desinteressadas. E, ou muito me engano, a
factura com uma conta “simpática” não tardará a ser apresentada. Esta gente não
é parva, muito menos generosa, não anda cá para perder e não entrega o ouro ao
bandido, assim, de mão beijada.
Não sei se, nos termos em que proposta
é conhecida, uma eventual taxação extraordinária dos rendimentos dos mais ricos
daria um contributo significativo para o equilíbrio das contas públicas. Duvido
– reitero, tal como a ideia está a ser transmitida – que, no caso, se possa
falar de justiça social ou fiscal. Porque, é bom lembrar, são rendimentos que,
supostamente, já estão sujeitos a uma taxa de imposto que ronda os cinquenta
por cento. E, convenhamos, o Estado ficar com metade daquilo que alguém ganha,
seja muito ou pouco, pode parecer-me muita coisa mas entre elas não se inclui
nada aparentado com justiça.
Se calhar – digo eu, que gosto muito
de dizer coisas – taxar outro tipo de rendimentos que agora escapam às malhas
do fisco era capaz de não ser má ideia. Desde as grandes negociatas bolsistas
até à economia paralela praticada por ricos ou pobres. Já um imposto especial
sobre todo o tipo de património, como sugere Miguel Cadilhe e o Bloco de
Esquerda se prepara para apresentar no Parlamento, embora enquanto tese me
pareça excelente, teria uma eficácia de cobrança mais que duvidosa. A avaliação
das cabeças de gado, das jóias, quadros, tapetes persas e outros bens de valor
assinalável, iria provocar uma carga burocrática capaz de dar azo a todo o tipo
de injustiças e de aproveitamentos diversos. Podendo até chegar ao extremo de
um qualquer contribuinte, apesar de riquíssimo, não ter liquidez para pagar o
imposto. À semelhança do que acontecia com aquela família algarvia a quem saiu
o totoloto, comprou carros e casas mas, por falta de dinheiro para o dia-a-dia,
teve de recorrer ao rendimento social de inserção. Com toda a legitimidade,
como, à época, explicou a segurança social.
É por tudo isto que continuo na minha.
A começar pelo Estado todos deviam ser obrigados a pagar o que devem. Se forem
criados mecanismos que permitam a célere e eficaz cobrança de dívidas – do
Estado, dos particulares e das empresas – a economia depressa retomará o seu
curso normal. Pode argumentar-se que não existe dinheiro para isso mas, em
minha opinião, não é verdade. Bastaria, a título de exemplo para as
administrações públicas, que fosse proibido o lançamento de novas obras e
vedada a aquisição de todo o tipo bens e serviços não indispensáveis enquanto houvesse um cêntimo
em divida. Se “isto” parava? Não, simplesmente, “isto” passava a ser gerido com
honestidade e rigor.